Nova decisão do juiz que anulou outra união homoaf

 

Nova decisão do juiz que anulou outra união homoafetiva violou a mutação constitucional

 

O juiz da 1ª Vara de Fazenda Pública de Goiânia anulou novamente um contrato de casal homoafetivo [01].

Este cidadão, por ser juiz, sabe, mas prefere fingir não saber que cabe ao STF, dentre outras coisas zelar pela Constituição Federal – CF/88 (art. 102, I, a, e ,III, a, b e c).

Ao tomar esta decisão, ele, mais uma vez violou a CF/88. Violou não só porque feriu o princípio da Isonomia previsto no art. 5º que estabelece que "todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros detidos no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança jurídica e à propriedade..." (grifamos), violou também a interpretação que devemos ter da Constituição, que já foi definida pelo STF em recente decisão [02].

A Constituição tem como um dos objetivos fundamentais "promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação" (art. 3º, IV - grifamos), objetivo este também "esquecido" pelo Magistrado, que, além de rasgar a nossa Lei Maior, tem se mostrado um ingrato, já que deve aos homossexuais os seus "15 minutinhos de fama [03]".

O senhor em questão também errou na sua fundamentação ao dizer que "o Judiciário não pode alterar a Constituição". O judiciário não pode alterar o texto da Constituição (alteração formal), esta sim, somente cabe ao Poder Legislativo, mas alterar a Constituição através da interpretação é uma das funções do Judiciário (alteração informal).

Tal alteração tem o nome de Mutação Constitucional, que nas palavras do professor Luis Roberto Barroso, "é o mecanismo que permite a transformação do sentido e do alcance das normas da Constituição, sem que se opere, no entanto, qualquer modificação no seu texto [04]".

A Mutação Constitucional permite que a Constituição se adapte às novas realidades sociais, e estas não podem ser desprezadas pelo Direito. Entretanto só é possível o Judiciário utilizar-se de tal instituito se a norma admitir tal interpretação, ou seja, a Mutação Constitucional tem como limite a redação do texto da própria Constituição e, não sendo este possível de se interpretar sem a sua alteração, a mutação em questão será inconstitucional, e chegará o momento da Constituição sofrer uma alteração formal, esta sim, repita-se, somente permitida ao Poder Legislativo, que o fará através da Emendas Constitucionais ou, em casos mais extremos com uma nova Constituição [05].

Para quem não sabe, o juiz é Pastor de uma Igreja Evangélica e admitiu que sua fé o influenciou na decisão, dizendo que "Constituição foi escrita sob a proteção de Deus", fazendo uma referência ao preâmbulo (único texto constitucional que não tem força normativa) [06] e que "família é aquele núcleo capaz e gerar prole (filhos)", mesmo não havendo qualquer disposição legal neste sentido. Há sim, no nosso ordenamento, talvez o mais recente, um conceito de família que aceita a hipótese de um casal homoafetivo ser considerado família [07].

Este conceito de família que o juiz apresentou então, não protegeria o casal heterossexual que tivesse um de seus membros estéril, pois este núcleo não seria capaz de gerar prole.

Voltando a questão da fé do juiz e sem querer polemizar (já que não é o objetivo) a Bíblia diz em Matheus 22:21 que Jesus disse: "daí a Cezar o que é de Cezar e a Deus o que é de Deus", ensiando que devemos cumprir com nossas obrigações de cidadãos e por isso membros de uma sociedade. Ao violar a Constituição, o juiz também violou a sua própria doutrina, já que desrespeitou a decisão no STF e nossa Lei Maior. Se o juiz não concorda com a posição do Supremo (e tem todo o direito) deveria dizer na sentença que homologaria a união homoafetiva pelo fato da questão já ter sido decidida, mas que não concorda com ela.

A postura tomada pelo magistrado contribiu para o abarrotamento do Judiciário, com a insegurança jurídica e com o descrédito da justiça perante o cidadão.

Deus é tão bom que é capaz de perdoar até esta atitude, tomada por uma pessoa não soube separar a Igreja do Estado (a história nos mostra o quanto foi nocivo para a sociedade, a interseção de ambos), e que uma pessoa estudada e culta, deveria ser a primeira a zelar pelo cumprimento do nosso ordenamento jurídico (sobretudo sendo juiz) para promover o que Jesus sempre defendeu, o livre arbítrio das pessoas. Resta agora aguardar uma posição do CNJ para evitar episódios lamentáveis como este.